Conceito de Oratório Salesiano
Por Vicente Vagner Cruz
INTRODUÇÃO
A constituição dos Salesianos (1988), artigo quarenta, diz que o Oratório “ é para os jovens a casa que acolhe, a paróquia que evangeliza, escola que encaminha para a vida e pátio para se encontrarem como amigos e viverem com alegria “. Pois o principal objetivo dos Salesianos segundo o artigo 31 das constituições é “educar e evangelizar os jovens segundo um projeto de promoção integral do homem orientado para Cristo, homem perfeito. Fieis às intenções de nosso fundador (Dom Bosco) visa formar bom cristão e honesto cidadão”. E o meio que os Salesianos usam para promoção do seu projeto pedagógico é o sistema preventivo que “baseia-se inteiramente na razão, na religião e na bondade”. (CF. MB XIII p.919)
Dom Bosco (1815-1888) foi um sacerdote da Igreja Católica que viveu em Turim (Itália), em pleno século XIX, um período em que a Itália estava passando por profundas crises sociais, porque nesse período ocorrem à revolução industrial em Turim, e muitos jovens e adolescentes vinham do interior com uma perspectiva de trabalho na capital, mas quando chegavam ficavam à mercê de toda sorte.
Observando essa realidade, Dom Bosco influenciado por vários pensadores da Itália como Felipe Néri e Vitorino da Feltre começa a desenvolver o Oratório na cidade de Turim. Graças a essas práticas os seus sucessores Salesianos começaram a difundir essa atividade em todo o mundo até chegar no Brasil em 1883 por intermédio do Império Brasileiro.
AS ORIGENS E O CONCEITO DE ORATÓRIO
1-O surgimento do Oratório.
O Oratório não foi inventado pelo padre da Igreja Católica, chamado João Bosco (1815 -1888) popularmente conhecido como Dom Bosco, pois já se tinha indícios nos séculos XV e XVI na Itália dessa experiência pedagógica. A influência laical vem da figura de Vitorino da Feltre no período da Renascença, e a religiosa de Felipe Neri um padre da Igreja Católica que fortaleceu a forma de educar de Dom Bosco e de como este pensou o seu Oratório aos arredores do bairro de Valdocco da cidade de Turim (Itália) de acordo com a citação a seguir de BORGES (2006).
“Embora a Tradição Salesiana dê um rotulo de originalidade á obra de Dom Bosco, é possível encontramos pistas para o entendimento dos alicerces da experiência de educador quando transcendemos tal tradição. Assim, minha intenção agora será mostrar que se o ‘Oratório primitivo de Valdocco’ já não se constituía uma novidade contemporânea, pode-se relacioná-los as experiências bem sucedidas nos séculos XV e XVI tanto a iniciativas laicas quanto religiosas, as quais, se não tem aparelho reconhecido da experiência de Dom Bosco (...) tem a legitimidade histórica em favor da Educação e da promoção da juventude”. (BORGES 2006 p. 4190)
Pode-se perceber que Dom Bosco sofreu forte influência do italiano Da Feltre (?) um leigo que viveu na cidade de Pádua (Itália) no período da do século XV, e que tinha uma obra chamada a casa Giocosa (mansão da alegria), era uma casa em que se ensina a formação moral e intelectual para os jovens (tanto do gênero masculino quanto do feminino) mais carentes dessa época, mas uma forma de atraí-lo utilizava jogos para atrair os seus destinatários.
“A contribuição prática de Da Feltre para educação deu-se com a aplicação de seus ideais humanistas e cristãos na educação escolar de jovens nobres na cidade de Pádua (Itália) em um ambiente denominado “Casa Giocosa”. Sintetizando o levantamento de vários autores, Perez (2003) diz que neste ambiente se pretendia era desenvolver a educação integral, segundo o ideal humanista, por isso os alunos tinham formação moral e intelectual, sem distinções entre homens e mulheres, com ensino de grego, literatura, filosofia, história, declamação e leitura pública para melhorar a eloqüência, aritmética, geometria, astronomia, música. A apropriação desses conhecimentos relativos mais os domínios cognitivos, valia-se da prática de jogos para ser aprendidos como: equitação, salto, corrida, esgrima, guerra simulada e jogos de bola, além de exercícios ginásticos”. (IDEM p. 4191)
Outro educador que influenciou o estilo de Oratório elaborado por Dom Bosco principalmente na parte religiosa foi o padre Felipe Neri (1515-1595) que viveu em Roma (Itália) no século XVI, em período em que se tinham muitos jovens e adolescentes que passavam extrema necessidade, pelas beiras das ruas Felipe Neri observando essa realidade, e o estado que eles e elas se encontravam criou um ambiente educativo e alegre para ajudar tanto materialmente como espiritualmente a todos esses necessitados.
“O contexto sócio-político de Roma na contemporaneidade de Felipe fez com que esse personagem envolvesse a vida em favor dos indivíduos necessitados de toda sorte de sustentos do espírito. Ele atendia aos doentes, encarcerados, condenados, pobres estudantes, órfãos, solteiras, enfim todos que sofressem e, para isso começou a contar com ajuda de outros e estruturar instituições de assistência, todas movidas pela estratégia da alegria, da brincadeira, que a todos cativava. (...) Esse tipo de apostolado de Felipe denunciava sua especial predileção pelos jovens, predileção essa que vira marcar o resto da sua vida. Sua entrega foi tão profunda no serviço aos pobres / jovens que cedeu as insistências de seu confessor e aos 36 anos de idade fez-se sacerdote, entendendo nisso uma vontade de Deus. A partir daí, seu apostolado teria uma intensidade dirigida sobretudo pela preocupação maior de assistência espiritual àqueles que já eram carentes da assistência material. (...) Nunes (1980), diz que no Oratório eram ensinadas a doutrina cristã e as letras, mas eram o entretenimento e o trabalho, em um ambiente de alegria animado por canto e alegria”( BORGES 2006 p. 4192).
Esses dois educadores ajudaram a fundamentar o trabalho elaborado por Dom Bosco e que ajudou colocar os primeiros pilares do Oratório juntando a parte laical dando um espaço recreativo para os jovens e os adolescentes poderem se socializar, e a dimensão religiosa para encontrarem um sentido para a vida, mas de uma forma alegre e divertida.
5.2-O Oratório na visão de Dom Bosco.
Dom Bosco que trabalhou no início de sua vida sacerdotal em favor dos jovens abandonados da cidade de Turim (Itália) no meio do século XIX, pois nesse período, esse país estava passando pela revolução industrial, e a conseqüência desse fenômeno é que existia uma grande migração de jovens e adolescentes do meio rural para a grande cidade para trabalhar na construção civil, e muitos deles ficavam sem uma orientação sobre a vida, pois ficavam com muito tempo ócio não aproveitado, e com isso ia contribuindo para o aumento da violência juvenil nesse tempo, e Dom Bosco conheceu a realidade de Turim em companhia do Pe. Cafasso, que foi orientador no tempo em que Dom Bosco se preparava para se tornar padre, visitando as cadeias, onde encontrava muitos jovens sem perspectiva de vida. Como o próprio Dom Bosco relata.
“Começou primeiro por levar-me às prisões, onde pude logo verificar como é grande a malícia e a miséria dos homens. Ver turmas de jovens, de 12 a 18 anos todos eles sãos, robustos e de vivo engenho, mais sem nada a fazer, picados pelos insetos, à míngua de pão espiritual e temporal, foi algo que me aterrorizou. O opróbio da pátria, a desonra das famílias, a infâmia aos próprios olhos personificam-se naqueles infelizes. Qual não foi, porém, a minha admiração e surpresa quando percebi que muitos deles saiam com firme propósito de vida melhor e, não obstante, voltavam logo à prisão, da qual haviam saído poucos dias antes” (1999 p. 104).
Após ver essa horrível realidade, ficava se perguntando qual a perspectiva de vida esses jovens iam ter depois de saírem da cadeia era necessário, que tivesse alguém lá fora para esperá-los como uma proposta nova para eles, e desde daí surge o Oratório do primeiro encontro de Dom Bosco com Bartolomeu Garelli, como o próprio Bosco relata a seguir:
- Meu bom amigo, como te chamas?
- Bartolomeu Garelli.
- De onde és?
- De Asti.
- Tens pai ?
- Não, meu pai morreu.
- E a tua mãe?
- Morreu também.
- Quantos anos tens?
- Dezesseis.
- Sabes ler e escrever?
- Não sei nada.
- Já fizeste a primeira comunhão?
- Ainda não.
- Já te confessaste?
- Sim, quando era pequeno.
- E agora, vais ao catecismo?
- Não tenho coragem.
- Por quê?
- Porque meus companheiros mais pequenos sabem o catecismo, e eu tão grande não sei nada. Por isso fico com vergonha de ir a essas aulas.
- Se te desse catecismo à parte, virias?
- Então sim.
- Gostarias que fosse aqui mesmo?
- Com muito gosto, contanto que não me batam.
- Fica sossegado que ninguém te maltratará. Pelo contrário, seras meu amigo. A coisa é só comigo e mais ninguém. Quando queres começar?
- Quando o senhor quiser.
- Esta tarde serve?
- Sim.
- E se fosse agora mesmo?
- Sim, agora mesmo. Que bom!
Levantei-me e fiz o sinal da cruz para começar; meu aluno não fez porque não sabia. Naquela primeira aula procurei ensinar-lhe a fazer o sinal da cruz e a conhecer Deus criador e o fim porque nos criou. Embora tivesse uma pouca memória, conseguiu com assiduidade e atenção aprender em poucos domingos as coisas necessárias para fazer uma boa confissão e, pouco depois, a sagrada comunhão.
A esse primeiro aluno juntaram-se outros mais. Durante aquele inverno limitei-me a alguns adultos que tinham necessidade de catequese especial, sobretudo aos que saiam da cadeia. Pude então constatar que os rapazes que saem de lugares de castigo caso encontrem mão bondosa que deles cuide, assista-os nos domingos procure arranja-lhes emprego com bons patrões e visitá-los de quando em quando ao longo da semana tais rapazes dão-se a uma vida honrada, esquecem o passado, tornam-se bons cristãos e honestos cidadãos. Essa é a origem do nosso oratório, que, abençoado por Deus, teve um desenvolvimento que então eu não podia imaginar. (BOSCO 1999. P 108-110)
Dessa forma surge o primeiro Oratório que Dom Bosco fez com o primeiro encontro com Bartolomeu Garelli, e esse menino ficou impressionado de como esse padre com um jeito diferente pode conquistar a confiança desse jovem, que em seguida trouxe os seus outros amigos. E Dom Bosco (1999) apresenta sua experiência de Oratório com os pequenos pedreiros de Turim (Itália) no inicio de sua vida sacerdotal.
“O Oratório funcionava assim: em todos os domingos e dias santos dava-se comodidade para se aproximarem dos santos sacramentos da confissão e da comunhão; marcava-se ainda um sábado e um domingo por mês para cumprir esse deve religioso. À tarde em uma hora determinada, entoava-se um cântico, dava-se catecismo, em seguida explicava-se um exemplo e distribuía-se alguma coisa, às vezes a todos, e outra por sorteio. (...) De modo geral o Oratório compunha-se de canteiros, pedreiros, estucadores, calceteiros, gesseiros e de outros que vinham de povoados distantes. Como não conheciam as igrejas nem ninguém, expunham-se ao perigo de perverter-se, especialmente nos domingos”. (Bosco 1999 p 111)
A preocupação de Dom Bosco com a relação social desses jovens pedreiros na cidade de Turim onde estava acontecendo o inicio da revolução industrial na Itália no século XIX; eles trabalhavam a semana inteira com baixos salários e no final de semana não tinham um lugar para ir, e não tinham nenhuma pessoa conhecida, por isso existia uma grande probabilidade de aumentar o índice da violência, e Dom Bosco com o seu método pedagógico atraia esses jovens para o seu convívio.
“Ao produzirem práticas instituídas como católicas e desta forma verdadeira, estes acabam também, elegendo um corpo especifico, alvo desta discursividade e produto dela. Este é o corpo do jovem – maleável em sua essência, displicente, passível de corrupção moral- e que por esses e outros motivos necessita da mão acolhedora de padres, bispos, colaboradores cristãos, para que seus caminhos não sejam desviados”. (NICOLAU 2005 p. 5)
No entanto para conseguir um lugar para acolher esses jovens pedreiros durou muito tempo, pois em cada local que ficavam logo eram expulsos por causa do barulho dos seus meninos até que um dia ele se instalou em um bairro chamado Valdocco que fica periferia da cidade Turim (Itália).
O objetivo de Dom Bosco a atrair esses jovens para seu Oratório era passar a doutrina católica e ao mesmo tempo daria uma formação cidadã para os seus jovens honrarem sua pátria como apresenta NICOLAU (2005).
“A educação da juventude caminhará lado a lado dos projetos de civilizar os jovens no cristianismo, tornando-os bons cristãos e honestos cidadãos. Cidadania e catolicismo convergiram para lados da mesma moeda. O bom cidadão seria aquele que honraria sua pátria e propagaria a fé católica, aquele distante dos deleites socialistas ou comunistas e protestantes contribuiria para a manutenção da ordem, seriam útil para o trabalho”. (IDEM)
Através do Oratório e de seu sistema pedagógico chamado “Sistema Preventivo”, onde Dom Bosco deu inicio sua obra iniciou sua instituição religiosa, e com o passar dos anos ganhou uma grande dimensão não somente na Itália, mas em todo o mundo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AZZI, Riolando. A obra de Dom Bosco no Brasil. São Paulo Editora Salesiana 2002 (Volume I)
______________. A obra de Dom Bosco no Brasil. São Paulo Editora Salesiana 2002 (Volume II)
BORGES, Carlos Nazareno Ferreira. “A casa Giocosa” “Oratório São Girolamo” “Oratório de São Francisco de Sales” experiência que se refazem e se aprimoram. IN Anais do V Congresso Brasileiro da História da Educação: O ensino e a pesquisa em História da Educação. Sergipe. 2005 (p. 4188 -4195) no site: www.faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/378CarlosNazareno.pdf
BOSCO, João. Memória do Oratório de São Francisco de Sales de 1815 a 1855 (Título Original Memorie dell´Oratorio di S. Francesco di Sales- dal 1815 al 1855 revisto por Pe. Julio Comba) tradutor Pe. Fausto Santa Catarina 2° Ed, São Paulo Editora Salesiana 1999.
COSTA, Humberto. Projeto Educativo Pastoral Salesiano: Para Crianças e Adolescentes em Situação de Risco Pessoal e Social Belém Editora Salesiana 1997.
CRUZ, Vicente Vagner. Um Oratório Salesiano como Proposta de Políticas Públicas. Trabalho de Conclusão de Curso em Ciências Sociais UFPA 2009.
NICOLAU, Fabiana. Moço para a pátria e para a Igreja: A produção de sujeitos nos enunciados da pedagogia salesiana. IN Anais do IV Congresso Brasileiro da História da Educação: A educação e seus Sujeitos na Historia. Góias 2005 (p. 1-10) no site:www.sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe4/individuais-coautorais/eixo03/Faiana Nicolau - texto.pdf
LEMONEY, Joseph. Memorie Biografiche di Don Bosco. Torino editore Salesiani 1956 (vol XIII)
SALESIANOS, Constituições e Regulamentos da Sociedade de São Francisco de Sales, Escolas Profissionais Salesianas, São Paulo 1985.
Fonte: http://www.artigonal.com/religiao-artigos/conceito-de-oratorio-salesiano-1076404.html em 28/07/2009.
Nenhum comentário:
Postar um comentário